Feliz ano novo, colegas da Caros Amigos
[4/1/2007]
No movimento estudantil muitas vezes era chamado de reformista e etapista. No começo, (tinha 17 anos) para ser franco, nem sabia o que isso queria dizer. Quando passei a entender melhor o jogo e sua narrativa, aquelas palavras de ordem, o vocabulário da esquerda, os nomes das tendências, o que propunham, como imaginavam o mundo etc., comecei a achar ridículo aquelas brigas insanas que se davam em ambientes fechados como os dos C.As.
Aquela disputa entre nós era pouco madura e nada produtiva. Mesmo assim, continuei participando da vida acadêmica e cheguei até a presidir um C.A., participar de chapas da UEE etc. Depois daquela fase, vieram outras, em que assisti processos semelhantes no movimento social, sindical, de mulheres, de negros, dos homossexuais, dos rurais, dos jornalistas...
Outro dia, em uma visita que a ministra da Igualdade Racial fez à redação de Fórum, um de nós perguntou se ela achava que o movimento negro havia amadurecido, se tinha conseguido ultrapassar aquela fase onde as brigas internas parecem mais importantes que as externas e se ela via alguma semelhança nesse processo com o que o movimento feminista havia vivido.
Para quem não a conhece bem, vale a pena passar a prestar a atenção nas idéias dessa mulher negra. Ela nos deu uma aula sobre a diferença de ambos os movimentos, mas reconheceu que essa é uma fase de todos. Eles amadurecem nas disputas internas. Depois dessa entrevista publicada em Fórum, Matilde Ribeiro foi capa de Caros Amigos. Vale a pena ler o conteúdo publicado por lá, caro leitor.
Lembro aqui também da conversa com José Dirceu, em meio àquele turbilhão onde ele ainda lutava pela sua defesa, dias antes da cassação de seu mandato pelo Congresso. Fórum foi a Brasília com quatro jornalistas e arrancou um depoimento histórico de Dirceu. Ali ele fez um balanço não só do momento que vivia, mas do processo recente da esquerda no Brasil, das perspectivas com o governo Lula, de suas certezas e dúvidas. Caros Amigos, depois também fez uma boa entrevista com ele, também capa, e merece ser lida.
A imprensa independente/alternativa/popular/diferenciada ou seja lá o que bem melhor parecer ao leitor, vive um processo de crescimento. Nós, da Fórum, temos orgulho de participar disso e sempre que possível vamos contribuir para sua construção. Tanto tocando a revista impressa, como melhorando o site, criando outros veículos e ajudando a outros colegas a fomentarem novas publicações.
Somos a favor da diversidade, do quanto mais melhor. Em debates costumo dizer, citando Eduardo Galeano, que prefiro um turbilhão de marimbondos a um rinoceronte. Ou seja, centenas de veículos a um único, centralizado. Há gente que discorda. Que bom.
Em alguns desses encontros, onde defendo tais teses, vejo gente de Caros Amigos. Como também quase sempre está lá a moçada militante e séria do Intervozes. Alguns foram até meus alunos, mas por um deles tenho um carinho todo especial, o Antonio Biondi. Seu pai, Aloísio, foi um grande amigo. Velho Aloísio, generoso, simples, especial e genial. Mesmo assim vi gente desdenhando e esnobando o velho. Coisas da vida...
Também não é incomum encontrar o Raimundo Pereira. Algumas de suas posições são diferentes das minhas, defende uma imprensa de caráter popular e acredita que os partidos devem fazer grandes projetos de comunicação. É um dos melhores repórteres de sua e de outras gerações. Está resgatando o projeto Retratos do Brasil. A última revista que recebi estava ótima. Sou fã do seu trabalho e de sua luta. Seus projetos merecem todo apoio.
Outro habitué é o Antonio Martins, o editor da página do Diplô brasileiro, além do excelente texto é muito bem informado. Sintonizado com o seu tempo, defende a internet e a ampliação do acesso a ela como caminho para a democratização da mídia. Concordo com ele. Ao mesmo tempo ele ainda sonha com um Diplô impresso. E em breve deverá lançá-lo. Sabe que conta conosco para que isso dê certo, afinal seria muito bom também lê-lo no papel. Aliás, fiquei sabendo que o Ricardo Kotscho está para lançar um projeto. Maravilha.
O Paulo da Viração é outro. A Viração é uma revista para jovens que vive numa batalha imensa. É admirável o trabalho que ele faz.
Há muitas outros veículos com qualidade onde tenho mais ou menos amigos. E ainda há muita gente séria sem publicações. Tem a galera da Revista do Brasil (Paulo Salvador, Donizetti e Vander), a Nova E, a Rits, a Carta Maior (Maringoni e Bia, só pra citar dois), o pessoal do Repórter Brasil, do Vermelho (mesmo sendo de um partido, belo site). Galera da Ocas, que está lutando para continuar, o Sergião da Oboré, o professor da USP, Bernardo Kucinski, o Brasil de Fato, o pasquinzeiros Ziraldo e Jaguar, a Margem Esquerda, da Boitempo, gente de outros estados, sites, blogs...
Parece que estamos crescendo, mas ainda somos poucos. Muitos outros veículos, gente mais nova do que eu e muito mais nova do que o Sergio de Souza, que edita a Caros Amigos e já fez tanta coisa legal, precisa construir produtos, ir à luta.
Sempre digo à moçada dos cursos de jornalismo, quando vou a alguma faculdade para palestras, que montem um site ou uma rádio comunitária ou seja lá o que for e comecem no mínimo a treinar. De repente, a coisa dá certo e eles construíram um espaço de trabalho. E vão aumentar a turma dos marimbondos.
Essa gente, caro Sergio de Souza, precisa chegar. Eles precisam ter todo o apoio da Fórum, da Caros Amigos e de outras publicações para que nossa luta seja um pouquinho maior. Não devemos entrar nessa de ficar criando constrangimentos ou querer ser os donos da bola.
Mas o leitor deve estar se perguntando, por que isso? Para que tanta ladainha. Estou na África do Sul cobrindo o que na Fórum chamamos de pré-FSM, que acontece no fim do mês no Quênia e recebi alguns e-mails de amigos e leitores. Gente achando um absurdo que numa carta de feliz ano novo enviada pela Caros Amigos aos seus leitores, Fórum seja tratada como “plágio” dela. Aliás, não só a Fórum, mas a recém-nascida Piauí também é citada.
Quando li a tal carta, me lembrei daquela época do movimento estudantil... Mas como hoje já entendo um pouco mais do vocabulário político, honestamente, não fiquei puto, mas achei deselegante. De qualquer forma, não escrevo esse texto por isso, mas para refletir sobre o papel que imaginamos devamos ter, o de regar a terra e não o de colocar cercas nos espaços que ocupamos.
É necessário também registrar que a carta enviada pela Caros Amigos era assinada por um leitor. Alguém que gosta daquela revista. Ok. Mas aqui na Fórum, quando há algo a dizer àqueles que respeitamos, quem assina as cartas sou eu, querido Sérgio de Souza.
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